sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Graça sem graça

Quantas vezes por dia a gente sorri? 10? 50 (para os mais fáceis, digamos)? E quantas vezes gargalhamos por dia? Uma ou nenhuma? Difícil pensar nessa sutil diferença, sem lembrar que as duas coisas estão vinculadas a uma única: a graça.
Quando sua conta bancária agoniza, seu coração apodrece e sua cabeça explode de tanto pensar, como gargalhar? Do que rir? Afinal, nada disso é engraçado.
Aí, você decide assistir um filme (comédia, claro) e percebe (em choque) que quase não mexeu a boca para esboçar um sorriso. A graça, de repente, escapou pela porta aberta. Quanto descuido! Ela se perdeu em algum momento entre o aqui e o daqui a pouco. Caminhou sozinha para um lugar sem destino definido. Uma coisa bem sem graça mesmo.
Acredito que tem fases na vida em que nosso humor vê e ouve o mundo de outra forma, não prevendo as quedas pelo trajeto. Claro que a gente consegue sorrir aqui e ali com facilidade. Numa mesa de bar, num seriado qualquer, num email imbecil. Mas gargalhar é bem mais difícil.
Talvez a graça tenha mais humor quando não é obrigatória. Quando não pensamos nela. Quando a gente não se preocupa em rir. Vai ver ela tem medo de ser lei.
Mas é importante lembrar que um filme não traduz a sua incapacidade de rir. Um seriado ou uma conversa também não. O que mede essa perda da graça é a sua cabeça, seu momento de vida, e não necessariamente suas escolhas, sua idade ou seus problemas.
As vezes, a graça se vai, mas sobra a emoção. Um comercial bem feito te arranca lágrimas verdadeiras. Uma obra de arte, suspiros apaixonados. Uma mulher bonita, um olhar alucinado (ou tarado). A intensidade foi apenas redirecionada, mas ainda está lá. Está viva!
E, quando você menos esperar, quando não se lembrar mais, a graça volta. Entra pela janela sorrateira e a sua gargalhada é tudo o que você poderá ouvir. Depois... resta, apenas, cultivar.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Amor sem barriga

Tem mulher que é cega e surda, mas (infelizmente) nada muda. Está no instinto feminino, creio. A gente fala muito, sempre. Porém, algumas exageram.
Ontem uma mulher disse ao marido que ele deveria emagrecer 10 quilos. Repito: 10 quilos. Qual o problema nisso? Ele não é nada gordo! Pelo contrário. Ele é bonito, magro e (o pior – para a mulherada de plantão) apaixonado por ela.
Veja bem, esse não é um texto indignado. Nem um texto só para dizer que a mulher é uma idiota, pois tem o marido que muitas pediram a Deus e não o valoriza, só menospreza. Não, não é isso (ou, pelo menos, não é só isso). Acontece que esse é um típico erro feminino: falar demais.
A mulher dessa história é linda (inegável) e, pelo jeito, ele acredita que é areia demais para seu pobre caminhãzinho. Homens podem ser mesmo uns bobos apaixonados. Mas não exagerem meninos. O mercado está difícil para nós – o que pode ser sempre ótimo para vocês heterossexuais bacanas.
Chego a conclusão que esse é o tipo de mulher que casa, manda no marido e, talvez, seja feliz para sempre. E esse é o tipo de homem que obedece, ama e, talvez, um dia perceba que deu mais do que recebeu.
Claro que não existem fatos concretos a respeito do casal. Soube apenas dessa história, fiquei chocada, mas sei que isso não representa a infelicidade (ou felicidade) deles. Porém, passei a pensar que as mulheres deveriam falar menos, ouvir mais e pensar no que realmente importa dentro de um relacionamento.
Eu não reclamaria de um relacionamento que houvesse amor, carinho, companheirismo, amizade, bom papo, admiração, paixão, atenção... Me recuso a acreditar que alguém que tenha tudo isso, ainda se importe com o corpo do outro. De verdade. Claro que ninguém deve se descuidar, mas que faça por saúde e não por estética. A vida é tão mais que isso, não é?
A gente quer (e deve) viver um grande amor. Definitivamente a barriga de ambos não deve se envolver nisso (a não ser em momentos óbvios, claro).

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Tem tanta coisa pra ontem

Ney Matogrosso faz diferença até quando é apenas o convidado em um show. Ontem, vi sua pose, ouvi sua voz e conferi que ele ainda tem um poder diferente dos outros. Abaixo, Coisas da Vida, letra de Alzira Espindola e Itamar Assumpção, eternizada na voz de "Ney Delícia" - que, obviamente, me ouviu gritar para ele no teatro.

Existem coisas na vida
Das quais até Deus duvida,
Tem beijos de boas vindas,
Tem beijos de despedida.

Tem choro, coro, decoro,
Entrada não tem saída,
Tem forum,falta de coro,
Tem um toque de Midas.

Tem quem apronte um salseiro,
Tem gente muito querida,
Tem cara de pau de monte,
Morte por uma dívida.
Tem tanta coisa pra ontem.

Existem coisas na vida
Das quais até Deus duvida,
Tem quem não tenha guarida nas vielas e avenidas.

Tem olho da rua, becos,
Tem ouro de tolo,um touro,
Tem vaca e mulher parida.

Tem gente que é só sucesso,
Como tem gente falida,
Tem gente que não tem berço,
Bandido, gente excluída.

Tem gente muito valente.
Tem gente só suicida.
E por ter gente demente,
Tem gente que é prevenida.
Tem coisa que segue em frente,
Tem coisa já falecida.

Existem coisas na vida
Das quais até Deus duvida
é o diabo a quatro querida.

Existem coisas na vida
Das quais até Deus duvida
é o diabo a quatro querida.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Uma gestação

Nove meses. Uma gestação. Minha avó dizia que tudo passa (ou se resolve) em nove meses. Nenhum problema se perpetua mais do que isso, ela afirmava. Adoraria que estivesse certa, mas creio que não é verdadeiro (pelo menos, não de todo). Porém é uma boa teoria (mesmo que simplória).
A gente se desenvolve na barriga de nossas mães por nove meses. Nesse tempo ganhamos braços e pernas; cérebro e fígado; coração e sensações. Em 40 semanas, assim como um problema vivenciado, não estamos preparados para ouvir, ver ou encontrar nenhum caminho que não seja um canto escuro e seguro. Sentimos isso até sermos obrigados a nascer. Aí, temos de encarar coisas muito piores como dores de barriga, fome, músicas e pessoas estranhas (definitivamente estranhas).
Acredito que minha avó falava para a gente pensar que nada é tão diferente e renovador do que uma gestação: se conseguimos sobreviver a isso, qualquer coisa é mais fácil. E, talvez seja mesmo verdade.
Analisemos: imaginem a sensação de um órgão (seu) sendo desenvolvido dentro da barriga de uma mulher (que você chamará de mãe). Você era praticamente nada. Um embrião sem graça e sem rosto que conseguiu chegar lá – apesar de não fazer ideia do que isso representaria. A partir daí, sua vida se transformou. E você passou a ter e receber coisas a partir de uma alimentação nojenta que passava por um cano. Tudo muito estranho.
Agora levemos a mesma teoria para um problema, um sofrimento, uma dor. Em nove meses você está habituado a ele. Como um peso nos seus ombros que você nem lembra que carrega. Você o leva aonde vai. Quando está sozinho e olha no espelho consegue vê-lo. Lembra que no início chorava, no fim não aguenta mais. Está tudo pesado demais para seguir com você assim... para o resto da vida. Você olha o seu reflexo e pensa que já não combina com você. Nenhuma roupa cai bem quando há um problema, ninguém é bom o suficiente quando você está dividido em dois (e ele não aceita ménage), aquela coisa incomoda para dormir, nenhuma posição ajuda...
Passadas as 40 semanas, o bebê nasce e é lindo (porque eles sempre são lindos). O seu problema não nasce. Você simplesmente pode cansar e o derrubar em qualquer lugar. Dane-se. Ele que seja de outra pessoa que queira carregar. Você não suporta mais. E aí... a vida pode ser mais leve, depois de nove meses.
Assim acreditava minha avó. Assim acredito eu. Claro que, infelizmente, isso não vale para tudo. Mas pode ser de grande auxílio para muita coisa e, o melhor, sem a dor de parto!

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

É melhor ser alegre que ser triste

Têm coisas que não passam desapercebidas (inclusive, algumas, são percebidas até demais). Uma foto de um antigo amor, uma ligação, a presença (sem querer) em lugar inusitado, um ‘olá’ meio de lado, um olhar nada 43... Tudo isso pode estragar o dia (com sorte, só o dia).
A gente sofre de ausência e de presença. Quando estamos juntos queremos muito mais do que é oferecido. Quando estamos separados, aquilo ainda é tudo que temos (ou tínhamos). A satisfação é ingrata, mentirosa e desleal.
Mas não somos as únicas culpadas. Não somos apenas nós que lideramos esse ranking de erros. A verdade é que, muitas vezes, eles nos fazem mal. Não adianta negar ou justificar (coisa que sempre fazemos). Eles são (muitas vezes) egoístas, individualistas e medíocres demais para não ver a nossa tristeza – ou, arrogantes demais para passar por cima dela, claro.
Sofrer por um amor é inevitável. Mas a gente é capaz de ultrapassar essa linha, seguir em frente e não deixar com que a ausência de alguém se transforme em nossa própria doença terminal.
Talvez essa seja a única maneira da vida nos dizer que é hora de enxergar outras oportunidades. Hora de enfrentar medos e seguir em direção de outra luz. Pode ser chegado o momento de narrar a nossa vida de outro jeito.
Conhecer pessoas novas não é cruel. Cruel é se reconhecer como uma pessoa velha, antiga, sem graça e mal humorada. Com aqueles que não conhecemos podemos ser animadas, felizes e otimistas – independente daquilo que já passamos na vida.
Mas... apenas nós mesmas podemos fazer essa escolha: afinal, o que você prefere? Ser feliz ou ser triste?

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

A gente vai levando

Todo mundo que já passou dos 30 sabe que nada acontece assim... de repente. Tudo que é (ou ficará) sólido demora a acontecer. Aí você cai, aí levanta, aí chora, descobre que consegue sorrir depois da queda, cai de novo, levanta mais confiante, depois tropeça e vê que ficou mais esperto... e vai levando – como diria, lindamente, Chico Buarque.
Na vida o que não é eterno não estava pronto para ocorrer. Pense nas amizades que você conserva. Aqueles que você ama nunca vão deixar de serem amados – mesmo que seja de alguma outra forma.
A gente escolhe a vida que queremos levar (levo realmente fé na frase do poeta Ferreira Gullar) e complemento que a gente também escolhe quem queremos que caminhe ao nosso lado.
Sabemos quem são os certos e quem são os errados. Tentamos salvar alguns que não querem ser salvos, até entender que esse é o livre-arbítrio de cada um. Mas ninguém passa impune na nossa vida. Todos representam algo e ficam conectados por um cabo imaginário e de uma força inacreditável.
Os amores passam, magoam, deixam cicatrizes... mas serão sempre lembrados como velhos amores (querendo bem ou mal). Os amigos são escolhidos como a melhor representação de nós mesmos. Essa identificação é eterna e fica (mesmo naqueles que mal vemos, por circunstâncias da vida). A gente escolhe e alguém nos escolhe. Isso não muda. E é isso que faz a gente se eternizar na memória de cada um que conhecemos.
Em algum lugar deve estar o tal outro alguém que nos completa. Aquele que une tudo, que encaixa, que não é por acaso. Mas, mesmo ele, não nos exclui daqueles que já estão conosco, seja na mesa da cozinha de casa, no bar, no trabalho, no telefone, no email... esses são nossos para a toda a vida e, só por isso, já nos completam fazendo com que sejamos aquilo que já somos (e tendo o maior orgulho disso).

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Medo de enfrentar

O medo é uma sensação estranha. Ao mesmo tempo que apavora, também pode excitar, estimular. É (imagino) a sensação de quem adora filmes de terror – e esse não é meu caso, pois tenho tanto medo desse tipo de filme que pode-se comparar com a mesma sensação de ver o terrorismo de perto, sentar ao lado de um homem-bomba ou coisa assim (e quase não é um exagero).
No entanto, aqui quero falar de outro medo. Exemplificar o medo do risco. Por que arriscar é tão complicado para a maioria de nós? Por que sempre achamos que o que pode dar errado (no risco) vai ser tão traumático que não vale a pena a tentativa? E, a principal pergunta, o que é tão aterrorizante que pode não valer a pena a tal tentativa? (se você não vai morrer ou fazer com que alguém saia prejudicado, claro).
Uma ligação para aquele cara que não te chamou pra sair (como prometeu), pode simplesmente te provar se ele está ou não afim. Tirar a dúvida sobre isso é um alívio e tanto, acredite.
Outro exemplo? Eu tenho um amigo que diz: se você não tem mil reais para pagar uma conta, também não tem três mil pra viajar. Então, segundo ele, que diferença faz? Viaje. Ok, devo concordar que isso é uma loucura tremenda, mas ainda é mais louco não se programar para ter o dinheiro (em uma viagem possível, cheia de parcelas), ter receio de enfrentar a solidão em outro país ou cidade (quando não há mais ninguém para compartilhar a empreitada) ou mesmo a barreira de uma língua desconhecida...
Medo de mudar de emprego, enfrentar uma nova carreira, fazer uma prova, um concurso, começar um curso, uma dieta rigorosa, uma operação milagrosa, uma apresentação inovadora, um pedido de aumento, um pedido de casamento...
O medo está entre nós em vários momentos, o grande desafio é encarar o túnel sem luz (pavoroso para mim), olhar para a frente, nada ver, mas mesmo assim seguir passo a passo até que, de repente (bem de repente), encontre a luz, num jardim cheio de flores com perfume delicioso, chamado Vitória (independente de tudo dar certo, ou não). Afinal, você tentou - e essa era a ideia inicial.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Eu sei

Sabe aquela música que toca? Eu reconheço. Ouço e sei que você está lá cantando e tocando sua guitarra imaginária. Não faz muita diferença onde é o "lá". Pode ser qualquer lugar, mas sei sua reação. Simplesmente sei.
Lembro de outro cheiro. Quando chega em mim, você aparece como mágica. Como se fosse entrar pela porta, sorrir e contar uma de suas piadas infames. Um cheiro natural e diferente. Ilegal e adocicado. Quando sinto, vejo você por aqui.
Se tenho vontade de não estar, de não falar, de sumir... entendo você. Você que esteve tantas vezes dentro de uma concha, em outro mundo... algum lugar paralelo ao nosso, em que não se vê, não se ouve e não se toca. Hoje, sei como ele é, conheço esse lugar.
Gostava de seu quarto adolescente. Aquela coisa rock n’ roll, com conversas em que apenas eu interpretava. As músicas que hoje canto e que já cantei com você. Hoje sou tão melhor e tão mais velha... hoje sei tão mais e você nem está aqui para ver.
Não amei muitos, mas amei demais. Sofri cada ausência como se nunca mais fosse viver nada daquilo. Bobagem. Claro que um dia tudo volta e é infinitamente melhor, nesse mundo cíclico. Mas quando a gente tropeça na solidão, vem as antigas memórias do amor.
Músicas (muitas), cheiros, jeitos, palavras, rostos, sensações... coisas que mesmo sem lamentar a gente sempre vai lembrar e não há nada de mau nisso. Está tudo bem.
Hoje eu sei que as lembranças não matam, não fazem mal, não querem dizer saudade. As lembranças são histórias mal contadas de uma parte da nossa vida. Elas não representam a verdade dos fatos, mas sim as coisas mais bonitas de cada etapa, simplesmente porque as ruins são esquecidas no meio do caminho. Ainda bem.

Mulher

Sou aquela que escreve
Sem ego ou poesia
Aquela que sente
E por isso precisa da caligrafia

Sou a imbecil que chora
Mesmo quando reconhece o anúncio
De uma notícia antiga
Declarada em um novo rádio

Sou a mesma que acredita
Aquela que crê em sinais
Que pula as ondas de um manto azul
Que vê na chama de uma vela o recomeço

Sou a filha que ama
Que não deixa de ser criança
A amiga, a irmã na mesa do bar
Aquela que não deixa de estar

Só sei viver com amor
Seja ele de dor
De riso ou frescor
Desde que venha inteiro e sem mágoa

Sou cética
E crente
Brava
E dedicada

Sou tantas e uma só
Sou tudo e nada
Sou eu e são todas
Mulheres sem mente e apenas um coração.