sexta-feira, 27 de março de 2009

Dia Branco

Geraldo Azevedo escreveu o que pra mim é a declaração mais limpa (no sentido figurado da palavra), honesta e apaixonante já escrita. Uma poesia em que o amor é aquilo que sempre sonhamos: com companheirismo, amizade, cumplicidade, confiança e cuidado.
“Pro que der e vier... até onde a gente chegar”. É isso que queremos. É nisso que pensamos. E é assim que somos (pelo menos eu, aqui, confesso).
Faço da poesia dele as minhas palavras para decifrar o amor mais puro e de verdade que já tive a oportunidade de ler. Eis, Dia Branco.

Se você vier
Pro que der e vier
Comigo...
Eu lhe prometo o sol
Se hoje o sol sair
Ou a chuva...
Se a chuva cair
Se você vier
Até onde a gente chegar
Numa praça
Na beira do mar
Num pedaço de qualquer lugar...
Nesse dia branco
Se branco ele for
Esse tanto
Esse tão grande amor
Se você quiser e vier
Pro que der e vier
Comigo, comigo.

terça-feira, 24 de março de 2009

Quem tem medo do lobo mau?

Ela acordou cedo. Não conseguia mais dormir. Precisava pensar. Precisava de ar. Precisava de amor. Levantou-se e não conseguiu nada disso. A cabeça fervia, não ventava e o amor lhe faltava.
Havia algumas garantias (sempre há). Afinal, era bonita, inteligente e agia como princesa. Sabia que uma hora um cavalo (e um príncipe, claro) pararia embaixo da torre e pediria para que suas tranças fossem lançadas (dramaticamente). Putz! Precisava deixar o cabelo crescer - urgente!
Mas, pensando bem, não queria um homem subindo pelos seus cabelos? Bem desagradável essa situação (fora a dor envolvida). Melhor que ele lhe acordasse de um sono profundo. Definitivamente. Flores e um pedido de casamento.
Estaria preparada para isso? Se fosse um canalha? Se a agarrasse a força em um beijo péssimo? E, o fato de já estar na cama, era um perigo! Não, não. Melhor não.
Poderia morar com anões. Viver uma vida feliz e cheia de amigos baixinhos e cantores. De repente, o Zangado lhe pareceria uma grande figura e, até (vejam só), apaixonante. Sempre gostou de desafios e tinha certeza de que, um dia, ele conseguiria sorrir com ela.
E se, no meio do caminho, ele lhe oferecesse uma maçã podre como presente? Ela não queria presentes baratos e estragados. Merecia mais do que aquilo.
Pensou em um sapo... O nojo era tanto que achou melhor mudar de assunto. Como seria feliz? Como encontraria o amor, a pobre princesa triste?
Relutou, relutou e decidiu que apelaria para o lobo mau de um bosque qualquer. Pelo menos assim ela não esperaria que um príncipe lhe contasse vantagens e jurasse tudo aquilo que não daria.
Princesa realista. Porém, pelo menos nessa história, o realismo tem uma boca bem grande, orelhas atentas e dentes afiados.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Traduzir-se

Ferreira Gullar

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?

quinta-feira, 19 de março de 2009

Dona Eunice

Dona Eunice, eu bem que te disse,
limpar é tolice, esfregar é ilusão...


Ela passou anos dizendo que limpava. Anos afirmando que sua coluna não lhe deixava limpar nada muito embaixo, e a labirintite não lhe permitia (nem) olhar para cima. A parte limpa estava sempre no meio.
Nunca olhe para o chão. Não ouse olhar para cima. Ordens da casa. Vamos ajudar Dona Eunice. Nesse ritmo, não sei bem como ou porquê, mas ela ficou mais de 10 anos no meio do caminho da limpeza.
Recusávamos pessoas com mais de 1,75 em casa (melhor não arriscar). Mais baixos que 1,40 somente os cães – coitados – ao menos nunca falaram nada.
O meio brilhava. Ou melhor, as roupas ficavam sempre bem passadas e a louça mais ou menos lavada – acho que tinha também miopia.
Dona Eunice (brilhantemente) manteve seu emprego enquanto deu, andando muito ereta (para cuidar da coluna) em seu salto de plataforma (7, se não me engano). Como? Era uma mulher e tanto.
Nunca encontrava o “chefe”. Aliás, nenhum dos dois queria isso. Ele, por não ser obrigado a falar sobre toda a sujeira do chão e do teto. Ela, porque não correria o risco de ouvir.
Quando alguém (que não o “chefe”) pedia para que ela fizesse mais coisas do que o “negociado”, ficava revoltada. Reclamava, usando todas as justificativas médicas e rezando para que o ele nunca soubesse de nada.
Mas, hoje, acabou. Nunca mais veremos Dona Eunice. Seu reinado míope e de labirinto duvidoso ganhou somente um “muito obrigado” e “sinto muito”.
Sentimos mesmo. Pela coluna, os olhos e a tontura. Sentimos por nunca termos feito jus ao seu trabalho “de meio”. Mas, Dona Eunice, entenda... tudo era assim... meio ruim.

domingo, 15 de março de 2009

Nem tão fundo assim

O tempo passa (voa até), mas nem sempre nossa poupança engorda – aliás, nesse caso, ela nem existe mais. Tudo bem, também! Difícil ter tudo ok na vida... Talvez (talvez) seja até melhor não ter, assim temos (ao menos) mais assunto, maior profundidade.
Quando a vida passa sem nenhum problema, as pessoas ficam meio fúteis, meio assim... sem assunto. Passam a não acreditar que os outros têm problemas, não sei.
Claro que ninguém queria ter uma vida problemática só para ser profundo. Aliás, se perguntados fossem, todos os “profundos” (nesse sentido) adorariam ser rasos, claro! Ninguém é besta! Mas é uma coisa a se questionar.
Será que seríamos seres complexos (como somos) se os problemas não existissem? Duvido. Sério. Acredito mesmo que não exista nada como um “sorriso burro e paranóico para não perceber a velocidade da queda”. Prefiro saber há quantas estou caindo. Quem sabe não acho um galho no meio do caminho para me segurar.
Sou uma pessoa que questiona tanto que tem sérias dificuldades de explicar um caminho mais fácil para (qualquer um) seguir. Você prefere grandes avenidas ou fugir do trânsito?
Na vida a gente também tem infinitas rotas a seguir. A dúvida sempre existe. Escolhemos o mais longo ou o mais curto, se questionando se o outro não é mais bonito ou mais rápido, se tem pedras no caminho ou flores. Quem é que sabe?
As vezes a tentativa da profundidade irrita. Mas ser rasa me deixaria frustrada. Então... sigo tentando. Mas não quer ir muito para o fundo. Tenho medo que uma hora me falte ar e eu não consiga mais voltar.


* Ah! Agora também escrevo (com e sem profundidade) para o blog da Realejo Livros. Quem quiser, dê uma olhadinha! www.realejolivros.com.br

segunda-feira, 9 de março de 2009

New Beatle

A juventude dos anos 60 me dá certa inveja (com todo respeito, veja bem). Já escrevi aqui sobre a falta de ídolos da minha geração, mas agora quero escrever sobre os grandes ídolos de uma geração: The Beatles.
As meninas gritam, choram, tremem, invadem lugares proibidos... qualquer coisa é válida para ter uma oportunidade com os quatro (com sorte) garotos de Liverpool. Como é que pode? Sim, eles são lindinhos (o John é um charme aos 24 anos) e sim, eles fazem a música ter “Something”. Mesmo assim, ainda é difícil de explicar.
É possível acreditar que muita coisa veio de marketing – já se fazia isso naquela época. De repente eles eram mesmo mais famosos do que Jesus, como disseram ser. Mas, a verdade é que tanto faz. Tanto faz porque o verdadeiro brilhantismo de todo esse processo de shows (com amplificadores ridiculamente pequenos – para um público imenso) e músicas incríveis não se vê mais por aí.
Não existiu (e nem vai) uma banda que transformasse uma geração e um conceito musical. Toda uma época – que usava cabelos “recos” – teve de deixar os cabelos crescerem em franjas e aprender um novo balanço. Um requebrado bem diferente.
Os Rolling Stones entraram na mesma barca e acabaram segmentando grupos. Quem gosta de um, não gosta de outro. Bobagem. Mick Jagger tinha (e tem) seu valor. O maior deles é continuar com a mesma disposição mais de 40 anos depois.
Elvis teve de dar o braço a torcer quando percebeu que, o que acreditou ser passageiro, tinha vindo para ficar, acabando com seu topete (nos dois sentidos). Só é uma pena que esses meninos tenham ficado tão pouco.
O amor por uma única mulher rompeu os Beatles. O amor por um único homem matou John Lennon. Mas a ilusão de quem viveu aquela época mágica continua no brilho do olhar ao som de “A Hard Day´s Night”. Nessa hora, os reis do iê iê iê têm mais valor do que nunca... e a juventude se eterniza através da música.
Se você reparar nos detalhes, vai ver um new Beatle surgindo ao seu lado - como se nada tivesse mudado. E, quer sabe? Não mudou mesmo (ainda bem).

quinta-feira, 5 de março de 2009

Tango a brasileira

Falando em música, acordei com essa hoje. Na voz da Elza Soares é ainda melhor (com todo o respeito ao Luiz Melodia, compositor da canção). Eis, Fadas. Um tango sem nenhum sofrimento e que faria qualquer argentino rodopiar.

Devo de ir, fadas
Inseto voa em cego sem direção
Eu bem te vi, nada
Ou fada borboleta, ou fada canção

As ilusões fartas
Da fada com varinha virei condão
Rabo de pipa, olho de vidro
Pra suportar uma costela de Adão

Um toque de sonhar sozinho
Te leva a qualquer direção
De flauta, remo ou moinho
De passo a passo passo...

quarta-feira, 4 de março de 2009

Música para ouvir

Não vivo sem. Simplesmente, não sei o que é ficar sem ela. Basicamente, rock (pesados e leves), MPB e samba. A música faz parte da minha vida. Cada lugar passado, cada momento vivido, cada letra de uma canção ou uma melodia me remetem a histórias (antigas, recentes ou, até, futuras) que jamais esquecerei.
Acordo e ligo o rádio (informações + música = viva!). Ouço na caminhada matinal. Ouço no banho. No carro. Trabalhando (me dá foco). No almoço solo. Na prática da musicoterapia (usada em momentos de mais alto estresse). No relaxamento. No romance. No jantar a luz de velas. Para dormir (as vezes). Para me animar (todas as vezes). Na depressão profunda. Na festa. Na balada. No bar (mesmo quando eu mesma canto, acompanhada de uma mesa animada). No carnaval. Na viagem. No ônibus. No avião. Em salas de espera (qualquer uma). Na praia. Na leitura de um livro. Para yoga. Para relaxar. Para correr. No churrasco com futebol. No almoço de domingo. No fim da segunda-feira (arrasada). Na trilha do filme. No momento de lembrar. No momento de esquecer...
Ouço música para viver.