quinta-feira, 19 de março de 2009

Dona Eunice

Dona Eunice, eu bem que te disse,
limpar é tolice, esfregar é ilusão...


Ela passou anos dizendo que limpava. Anos afirmando que sua coluna não lhe deixava limpar nada muito embaixo, e a labirintite não lhe permitia (nem) olhar para cima. A parte limpa estava sempre no meio.
Nunca olhe para o chão. Não ouse olhar para cima. Ordens da casa. Vamos ajudar Dona Eunice. Nesse ritmo, não sei bem como ou porquê, mas ela ficou mais de 10 anos no meio do caminho da limpeza.
Recusávamos pessoas com mais de 1,75 em casa (melhor não arriscar). Mais baixos que 1,40 somente os cães – coitados – ao menos nunca falaram nada.
O meio brilhava. Ou melhor, as roupas ficavam sempre bem passadas e a louça mais ou menos lavada – acho que tinha também miopia.
Dona Eunice (brilhantemente) manteve seu emprego enquanto deu, andando muito ereta (para cuidar da coluna) em seu salto de plataforma (7, se não me engano). Como? Era uma mulher e tanto.
Nunca encontrava o “chefe”. Aliás, nenhum dos dois queria isso. Ele, por não ser obrigado a falar sobre toda a sujeira do chão e do teto. Ela, porque não correria o risco de ouvir.
Quando alguém (que não o “chefe”) pedia para que ela fizesse mais coisas do que o “negociado”, ficava revoltada. Reclamava, usando todas as justificativas médicas e rezando para que o ele nunca soubesse de nada.
Mas, hoje, acabou. Nunca mais veremos Dona Eunice. Seu reinado míope e de labirinto duvidoso ganhou somente um “muito obrigado” e “sinto muito”.
Sentimos mesmo. Pela coluna, os olhos e a tontura. Sentimos por nunca termos feito jus ao seu trabalho “de meio”. Mas, Dona Eunice, entenda... tudo era assim... meio ruim.

2 comentários:

Unknown disse...

Não se iluda, elas não acabam. Esse mundo "doméstico" é repleto de Donas Eunices e de patrões tolos e alienados; êstes sim, não querem olhar para cima e muito menos para baixo, são os piores cegos e adoram fugir dêsses, digamos, entraves.

♫ agora amor?
Dona Eunice meu bem,
como é que nós vamos fazer ♫

Ju Rodrigues disse...

Eu diria que esse patrão é muito mais bondoso do que "alienado"... mas você tem razão, as Donas Eunices não acabam nunca!

bei Ju