domingo, 24 de outubro de 2010

Espelho, espelho meu

Tem um dia que a gente acorda, se olha no espelho e não se vê exatamente. Nada parecido com a dramaticidade de Kafka ou um filme de terror qualquer. A gente simplesmente se olha e não se reconhece como um todo. Começa a prestar atenção que muitas coisas mudaram e aí, se você já não é o mesmo, quem então é?
Pergunta estranha, mas muito própria de quem faz aniversário. Depois dos 30 a gente já não sabe se está no caminho certo das coisas, se as escolhas foram as melhores e ainda duvida que exista tal perfeição. Entre uma dúvida e outra o espelho é um mero detalhe, na verdade.
Nem vou repetir o chavão se o que desejei na adolescência para minha vida deu certo – até porque a resposta seria obviamente negativa (mas alguém responderia que deu certo? Tudo funcionou perfeito como nos desejos infantis? Duvido).
O que vejo no espelho não é estética de alguns fios brancos que arranco sem dó, ou algumas rugas infelizes que insistem em se fazer cada vez mais presentes. Isso, tiro de letra. O que vejo e que me assusta é a quantidade de coisas que já passei. O número de pessoas que perdi (em vida e em morte), as saudades que ainda carrego de muitas delas, os problemas, as prestações atrasadas, o desamor de muitos momentos, a solidão que volta e meia cola na minha, algumas lágrimas aqui, problemas jurídicos ali... tantas, tantas coisas, que o espelho é até bacana comigo, pensando bem. Poderia mostrar muitos mais anos do que tenho.
Mas aí, vem também toda a carga positiva – e que também faz parte da mudança. Uma família de amigos, a descoberta maravilhosa de que ter poucos e bons faz mais diferença do que ter o mundo inteiro, as viagens, as risadas em mesas (qualquer mesa), os amores idos (não posso negar de que fui amada e essa sensação é renovadora), os beijos e abraços verdadeiros, as bebedeiras hilariantes, as conversas filosóficas, os shows incríveis que vi, os livros emocionantes que já li, os filmes brilhantes que me encantaram e as músicas que fazem parte da minha vida. Essa carga está comigo. Toda comigo.
Não, o espelho não é mais o mesmo. Acho que de ano para ano nunca é. Somos diferentes a cada dia e essa evolução é que nos faz melhores (ou piores, claro). A intenção não é envelhecer, mas encarar o envelhecimento como parte de uma grande experiência, carregada de esperança por momentos ainda melhores. E assim, os anos vão passando... e o reflexo que se dane!

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