quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Criando personagens

Texto novo na Realejo:

http://juliana-realejo.blogspot.com

Samba do Criolo Doido

Em homenagem ao meu pai, que sempre me enriquece culturalmente a cada sentada em uma mesa (no bar ou em casa), segue a letra do belíssimo (e louquíssimo) samba de Stanislaw Ponte Preta. Simplesmente brilhante!

Foi em Diamantina
Onde nasceu JK
Que a Princesa Leopoldina
Arresolveu se casá
Mas Chica da Silva
Tinha outros pretendentes
E obrigou a princesa
A se casar com Tiradentes

Lá iá lá iá lá ia
O bode que deu vou te contar
Lá iá lá iá lá iá
O bode que deu vou te contar

Joaquim José
Que também é
Da Silva Xavier
Queria ser dono do mundo
E se elegeu Pedro II
Das estradas de Minas
Seguiu pra São Paulo
E falou com Anchieta
O vigário dos índios
Aliou-se a Dom Pedro
E acabou com a falseta

Da união deles dois
Ficou resolvida a questão
E foi proclamada a escravidão
E foi proclamada a escravidão
Assim se conta essa história
Que é dos dois a maior glória
Da. Leopoldina virou trem
E D. Pedro é uma estação também

O, ô , ô, ô, ô, ô
O trem tá atrasado ou já passou

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Você lembra de mim?

Sou musical. A minha vida se relaciona com música. Sempre. Não é a primeira vez que digo isso aqui. Mas fico impressionada como a música pode te transportar para outra idade, outro tempo e outros amores.
Posso voltar aos 13 quando ouço um reggae antigo. Aí, consigo me ver dançando dentro de um elevador com um grande (e velho) amigo. Com Help, vou mais longe e me enxergo menina, desenhando capas de discos numa cozinha alaranjada e comendo macarrão com salsicha. Um axé odioso me leva para um carnaval divertidíssimo em Ilha Bela. Um outro (mais recente), me transporta para outro litoral.
Para mim, toda viagem tem sua trilha, assim como todos os grandes encontros, os grandes filmes, as grandes festas, os grandes acontecimentos e, claro, os grandes amores. E foi esse último que me fez pensar.
Será que os homens lembram das (ex e atuais) mulheres quando escutam uma música? Um devaneio bobo (como tantos), mas pense bem. Todos os amores ganham uma música, uma trilha, não? É uma seleção especial em que sentimos saudades ao ouvir, ou sentimos a dor do momento que passamos. Com pouco esforço conseguimos até sentir o amor novamente. Aquele aperto antigo no peito, aquele cheiro... Enfim, uma melodia pode fazer uma miscelânea de sensações.
Lembro que já tive problemas com o Chico Buarque. Doía demais. Hoje, claro, passou, mas uma música em especial me faz sorrir e lembrar de muita coisa boa (e ruim). Em outra fase uma banda inteira me deixou intrigada. Sem saber o que estava sentindo realmente – uma mistura incerta de amor, ódio e tristeza. Aí, passa e você se lembra que as coisas começam e terminam. Como devem ser.
Mas e eles? Sentem o mesmo? Dizem que quando pensamos muito no que o outro está sentindo ou pensando, quer dizer que ainda gostamos, queremos de volta... Bobagem. A verdade é que mulher é tão imbecil (desculpem a sinceridade) que até quando o amor não existe mais, a gente dá um jeito de lembrar que um dia ele esteve lá. E como masoquistas de plantão, lembramos também do quanto a gente se entregou sem ter a mesma reciprocidade.
Nessa hora, todas nós somos meio iguais, comprovando que, até quando acaba, damos um jeito de cobrar o cara – mesmo que mentalmente. Dá uma vontade de fazê-lo sofrer, nem que seja por um segundo. No timbre da guitarra, na voz, na letra...
Tudo bem, meninos, isso só acontece quando a tal música (ou trilha) toca. Depois a gente esquece e tudo volta ao normal (seja lá o que é ser normal). Não se preocupem.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Segredo de carnaval

Seu trabalho era, para muitos, uma vergonha. Na época, uma pouca vergonha. Mas ela mantinha um certo orgulho de si própria. Afinal, não teria como se sustentar não fossem as noites na maior casa de prostituição da cidade. Aquele tipo chique.
Cidade pequena, com boca pequena. Todo mundo sabia o que fazia, mas poucos homens a tinham visto como um todo (digamos assim). Era preciso bastante dinheiro para tal. Quem viu, nunca mais esqueceu. Essa era sua promessa.
Seu número naquele pequeno cabaré com símbolo duvidoso, era formidável (gíria da época). Dançava como ninguém e nem precisava se esfregar em barra de ferro para fazer a cabeça dos homens. Tinha toda a flexibilidade que precisava para chamar a atenção deles.
O ápice da noite ficava por conta da troca de roupas. Mudava de vestido, de cor, de modelo em uma fração de segundos e a olhos vistos. Ninguém sabia como. Todos se intrigavam, perguntavam... mas esse segredo guardava a sete chaves.
Seu outro segredo chamava-se amor. Queria muito sentir e, principalmente, que alguém sentisse por ela. Sonhava com um príncipe que a tirasse daquele lugar e a deixasse ser dona de casa, mãe, esposa. Sem números.
E como num conto de fadas, esse segredo se revelou e ele apareceu. Se encantou com a dança, com a troca de roupas, mas se apaixonou mesmo foi pelo sorriso da moça. Gostava tanto que lhe entregou um anel. Ela mal acreditou. Sairia dali sem nenhum remorso. Não, não era um tormento o que fazia, mas já estava cansada, e havia alguém que lhe amava. Aceitou.
De família tradicional, o moço precisava casar na igreja. Ela rejeitou, avisou que seria muito difícil mentir assim. Mas cedeu. Convidou um amigo da noite para entrar com ela no palco mais difícil de sua vida. Nunca tremeu tanto. Tantas noites tirando tudo e rodopiando não ajudaram em nada. Claro - não tinha nenhuma experiência com vestidos brancos.
Quando finalmente em casa, agradeceu a família que construiria. O passado será esquecido com o tempo. Ou quase.
30 anos depois, a televisão mostra a comissão de frente da Unidos da Tijuca. Sua memória estalou. Estava ali, na sua frente, o seu número secreto. Não se atreveu a fazer nenhum comentário - nunca na frente dos filhos. Mas sabia que alguém, em algum lugar, se lembraria de ter visto aquilo em uma casa noturna chique, num número feito por uma mulher que era um sucesso.
Assistindo a apuração da quarta-feira de cinzas, sorria com prazer a cada 10 da escola. Seu segredo se manteve bem guardado: virou enredo e ganhou o carnaval.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

O Haiti não é aqui

Foram 27 dias. Vinte e sete longos, isolados, tristes, fantasiosos, esperançosos, sujos, confusos, estranhos, problemáticos, doídos e empoeirados dias. Sua vida foi repassada lentamente na mente. Nada de filme rápido, tudo durou bem mais do que uma minissérie. Mais do que uma cena longa de um filme mudo.
Tinha medo de dormir. Acreditava que se o fizesse, ficaria ali para sempre, sem ser encontrado. Ou pior: a morte poderia se confundir e levá-lo para uma viagem que ainda não estava pronto. Na dúvida, se manteve alerta. As vezes, os olhos falhavam, mas, como (ali) a hora não tinha relógio, não via o tempo passar. Mas sabia que passava (mesmo que lentamente).
De onde estava não via a noite, assim como não fazia ideia de quando o sol nascia. Era sempre escuro e muito difícil.
O que mais dificultava era a impossibilidade de se movimentar, de falar. Todos aqueles dias na mesma posição, olhando para a mesma direção, sem a menor possibilidade de pronunciar um grito (mesmo que surdo). Cansava. Entristecia. Endurecia.
Não comeu nada em todos esses dias. Não bebeu nenhuma gota d água – mas jurava ver uma pessoa lhe entregando um copo por dia (como mágica, crença ou miragem).
Quando imaginou que nada mais pudesse fazer; quando agonizava de dor; quando não aguentava mais chorar, fechou os olhos e desistiu. Nesse mesmo momento, um clarão se abriu. A luz entrou e a dor pareceu querer cessar. Finalmente o vigésimo sétimo dia chegou e seu martírio acabou – soube depois.
Foi carregado e seus olhos mal conseguiam acreditar no que viam: seu país fora transformado em poeira. O que era cimento, hoje parece papel. O que era branco ficou cinza. Imaginou quantos amigos e parentes se perderam naquele entulho. Fechou os olhos e se desculpou. Talvez tenha feito mal em não se entregar, em beber a água da fé para lutar pela vida.
Agora estava sozinho. Sem casa. Sem família. Sem nação. Mas seu coração (esse teimoso) não desistia de bater. Ele, hoje, já não sabe mais porquê.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Por um clone sincero

Não seria incrível contratar uma pessoa (ou ter um clone) para fazer tudo o que você acha chato na vida? Coisas como:
- Fazer negócios. Alguém para negociar seus cartões de crédito, seu parcelamento de carro, suas tarifas no banco, empréstimos, o (não) pagamento de contas, controle de gastos, planilhas (odiosas) e, claro, os pedidos de aumento (muito bem justificados).
- Comprar roupa em liquidação. Uma coisa bem fútil, mas necessária na vida. Quem aguenta aquele empurra-empurra feminino, mesmo por um preço incrível? Não dá. Não é que eu tenha nascido para a 5th Avenida (o que nasci), mas o Braz não me apetece, sabe? Tenho vontade de sair correndo, gritar ou ter o maravilhoso poder de ficar acima de todas as pessoas (como se flutuasse), para não esbarrar em ninguém, não pegar fila, nada.
- Ir para a balada quando você sabe que deveria, mas não tem a menor condição/vontade disso. Nesse caso, essa pessoa deveria ser seu clone, pois a aparência é importante nesse tipo de evento, mas... se for alguém confiável e que te represente de uma forma maravilhosa, conseguindo inclusive alguns telefones e encontros, vale!
- Processar alguém. Claro que, na real, nós contratamos advogados, mas temos preguiça de processar (ou eu tenho). Tive um super problema com a TAM - divulgado aqui (e só aqui) -, o qual nada fiz. Era para o juizado de pequenas causas e tem de ir lá, no horário certo (e completamente impossível para quem trabalha) para brigar. Desisti. E, o pior, não me arrependo.
- Discutir o relacionamento. De verdade, por que temos de fazer isso? Muda o quê, exatamente? Os dois sabem quando está ruim, quando não tem jeito ou o que fazer para melhorar. Mas não tem jeito. É preciso colocar na mesa, falar e falar e falar... É tão exaustivo que só de escrever já cansa. Quando isso acontece, em geral, um sempre se dá melhor por ter argumentos muito superiores – e definitivamente, esse um, não sou eu. Sempre concordo para acabar logo e depois quero bater a minha cabeça na parede por não ter dito.
- Trabalhar em dia de ressaca ou de desgaste físico, ou de saco cheio mesmo. Alguém que fosse no seu lugar em seus dias péssimos e soubesse exatamente o que fazer. Essa pessoa não te substituiria como profissional, mas resolveria nos dias em que você quer colocar a casa em ordem, dormir mais ou prolongar o final de semana. Afinal, trabalhar é legal e você não quer parar totalmente (pelo menos, não deveria querer).
É uma lista infinita, na verdade. Mas (essa) era com que eu começaria. Um devaneio imbecil e utópico (como a maioria), ou seja: uma bobagem. Mas cheia de sinceridade.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Longe do mar. Perto das flores.

A casa amanheceu com o perfume de rosas brancas. A roupa de hoje respeita a cor do dia: branco e azul. Brincos e colares refletem sua imagem, sua vaidade, suas preferências.
Para fazer onda, um banho demorado (hoje não tem aquecimento global). 02 de fevereiro. Dia de Iemanjá. Data de lembranças, agradecimentos e pedidos (porque ninguém é de ferro).
Hoje a festa é no mar. Lamentavelmente, o mar está longe daqui. Pela janela somente verde e cinza, sem nenhum charme, espuma, brisa ou maresia. Mas se fechar o olho é possível enxergar tudo. Santos e Salvador estão logo ali misturados - com bastante facilidade e claridade. De olhos fechados vejo as ondas, sinto o mar bater e (até) me balanço no meu barco imaginário... é chegada a hora de esquecer, desejar e pular.
Iemanjá é mãe e quer apenas felicidade aos seus filhos. Deseja a paz, a saúde e uma vida protegida pelo manto azul da cor do céu. Deseja que o dia-a-dia tenha a transparência de suas águas; que nossa personalidade seja tão brilhante quanto seus cabelos refletidos pelo sol ou pela lua.
Ela nos protege através da natureza. Nossa Senhora nos protege através de símbolos e muitos nomes. As duas são, hoje, uma só. E para nós, seres comuns, representam fé e beleza.
O mar pode sim estar longe, mas o sentimento é um só, e está pertinho... bem aqui dentro, com o mesmo aroma das rosas, a mesma entrega... A maresia? Bom, ela está em todo o contexto.
Salve Iemanjá hoje e sempre.